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Dados Utilizados e Selecção de Acontecimentos

Os dados analisados, correspondentes a uma luminosidade de 51.1 pb$^{-1}$, foram recolhidos em 1997 pelo detector DELPHI, durante o funcionamento de LEP a uma energia de centro de massa de 183.2 GeV.

Na comparação entre os dados e as previsões do Modelo Padrão, foram utilizadas duas amostras de acontecimentos Monte Carlo $e^+e^- \rightarrow q\bar{q} (\gamma)$, geradas a 184 GeV, utilizando Pythia ($\cal{L}$ = 122.6 pb$^{-1}$ ) e KoralZ ($\cal{L}$ = 206.3 pb$^{-1}$ ). As secções eficazes previstas pelos dois geradores são diferentes: 106.0 pb no KoralZ e 100.3 pb no Pythia. Como foi referido no capítulo 3.4, a secção eficaz prevista pelo Pythia é incompatível com os valores obtidos com outros geradores. Na comparação com os dados usaram-se as distribuições diferenciais produzidas pelo Pythia, mas assumiu-se um valor de 106.7 pb para a secção eficaz total, valor esse obtido com cálculos semi-analíticos realizados com o programa Zfitter [14], que incluem todas as correcções de QED a $O(\alpha)$. Todas as figuras incluídas neste capítulo com comparações entre dados e Monte Carlo, utilizam os estados finais $q\bar{q}$ gerados com KoralZ (com a secção eficaz correspondente, 106.0 pb). Existem outros processos padrão que dão origem aos mesmos estados finais e que foram também simulados; destes destaca-se a produção de pares $W^+W^-$, que constitui o maior fundo na análise de $q\bar{q}(\gamma)$ a esta energia. Na tabela 5.1 são apresentados todos os processos gerados com indicação do gerador utilizado e da luminosidade correspondente. Estes acontecimentos passaram pela simulação completa do detector DELPHI (DELSIM [15]), sendo depois reconstruídos com os mesmos algoritmos que se utilizam na reconstrução de dados reais (DELANA [16]).


Table 5.1: Simulações de Monte Carlo utilizadas para as previsões do Modelo Padrão. Todos os acontecimentos foram gerados a uma energia de centro de massa de 184 GeV.
Processo gerador $\sigma$ (pb) $\cal{L}$ (pb$^{-1}$)
$q\bar{q}$ KoralZ 106.0 206.3
$q\bar{q}$ Pythia 100.3 122.6
Bhabha B.K. [17] 1260.7 108.3
$\gamma \gamma $ col. TWOGAM [18] 2307.0 12.4
$\tau\tau$ KoralZ 8.74 801.3
$W^+W^-$ Pythia 15.44 390.3
We$\nu$ Pythia 0.60 1750.0
Zee Pythia 6.81 373.9
ZZ Pythia 1.34 952.2


A reconstrução total do acontecimento começa com a reconstrução da informação total em cada sub-detector, a identificação de traços, o ajuste de trajectórias e a sua extrapolação; só depois de se ter uma visão global das trajectórias é que se parte para a identificação das partículas e dos vértices primário e secundários. A estrutura final dos dados contém a informação individual de cada deposição de energia ou traço e a informação obtida pela associação destas quantidades.

Só se consideram traços com momentos superiores a 0.1 GeV/c e com parâmetros de impacto inferiores a 4 cm no plano transverso e 10 cm na direcção do feixe. Deposições de energia superiores a 100 MeV, que não estejam associadas a traços carregados foram consideradas como "energia neutra".

Os princípios básicos da identificação de partículas foram explicados no capítulo anterior. Deposições de energia nos calorímetros electromagnéticos são identificadas com fotões ou electrões conforme exista ou não um traço isolado compatível com a sua posição. Uma partícula não isolada foi provavelmente originada pela hadronização de uma partícula com côr e tanto traços como deposições de energia neutra têm de ser associados num "jacto" que pode ser identificado com um quark ou gluão primário.

Para definir o isolamento das partículas foi usado um critério global que não depende da reconstrução das outras partículas ou dos jactos. Definiu-se um cone, no interior do qual se associou toda a energia à mesma partícula, e um outro cone exterior no qual não deveria existir energia. Para que uma deposição de energia neutra seja identificada com um fotão é necessário que a energia seja de, pelo menos, 5 GeV no cone interior, com uma meia-abertura de 6$^\circ$(5$^\circ$na região 45$^\circ$$<\theta<$88$^\circ$$\cup$ 92$^\circ$$<\theta<$135$^\circ$) e igual ou inferior a 1.0 GeV entre este e um cone exterior de meia-abertura de 15$^\circ$. A energia contida no cone é separada entre carregada e neutra e no caso dos fotões não se permitiram mais de 250 MeV de energia carregada [19].

Acontecimentos com mais do que cinco traços de acordo com os critérios acima definidos foram considerados "hadrónicos" - a presença de muitas partículas indica a existência de hadrões; e estes são os acontecimentos que definem a amostra base da presente análise.

Os hadrões foram associados em jactos através do algoritmo de DURHAM [20]. A definição topológica de um jacto nem sempre é clara, já que as diferentes partículas podem estar espalhadas por todo o detector e, sendo assim, a definição do número de jactos só pode ser feita de forma probabilística. No algoritmo de DURHAM, associam-se em cada iteração as duas partículas mais próximas, substituindo-as por uma pseudo-partícula com 4-momento igual à soma dos 4-momentos das duas partículas inicias. A "distância" é medida por uma variável ($y_{ij}$) que pesa as massas invariantes de cada par, dependendo da energia das duas partículas ($E_i$), do ângulo entre elas ($\alpha_{ij}$) e da energia total visível ($E_{vis}$): $y_{ij} = 2 \min{(E_i^2,E_j^2)}/E_{vis}^2.(1-\cos{\alpha_{ij}})$. O processo é iterado até que $y_{ij}$ seja superior a um determinado valor ou até se atingir um número pré-definido de jactos.

Nesta análise, os acontecimentos são forçados a dois jactos e são conservados apenas se o número de traços carregados for superior a seis, sem que nenhum deles seja identificado como leptão isolado. A energia visível na região com detecção de traços (entre 20$^\circ$e 160$^\circ$em ângulo polar) tem de ser superior a 20% da energia de centro de massa e os jactos devem ser detectados nesta região. A partícula mais energética de cada jacto deve ter um momento superior a 1 GeV/c e o momento total do jacto deve ser superior a 10 GeV/c. Os fotões podem ter energia depositada no calorímetro hadrónico mas, nesse caso, mais de 90% desta energia deve estar localizada na primeira camada da HCAL; recuperam-se, assim, fotões cujas cascatas não tenham sido totalmente contidas pelos calorímetros electromagnéticos ou que tenham passado pelas divisões entre os módulos da HPC.

Utiliza-se ainda um segundo conjunto de cortes, definidos especificamente para reduzir a contaminação de acontecimentos do tipo $WW$. O processo $WW$ origina três tipos de estados finais de acordo com os canais de decaímento de cada um dos bosões ($q\bar{q}$ ou $l\nu$). No caso em que os dois $W$s decaem leptonicamente, o estado final é caracterizado pela existência de leptões isolados e pela redução da energia total visível; no caso em que um dos bosões decai para leptões e o outro para quarks o estado final tem dois jactos e um leptão carregado e também uma redução da energia visível; no caso em que os dois $W$s decaem hadronicamente existem quatro jactos no estado final. Os dois últimos casos dão origem a acontecimentos que produzem um fundo na análise do processo $e^+e^- \rightarrow q\bar{q}$, isto acontece quando o leptão carregado não é detectado ou é mal identificado, no caso semi-leptónico, e quando não se consegue ter uma indicação clara do número correcto de jactos, no caso hadrónico.

Os cortes específicos para reduzir a contaminação de acontecimentos de quatro jactos baseiam-se nas variáveis $ycut$ do algoritmo de DURHAM; definindo-se valores máximos para as distâncias mínimas entre partículas adjacentes de 0.15, quando se forçam as partículas a dois jactos ( $ycut_{3 \rightarrow 2}$) e de 0.015 quando se forçam três jactos ( $ycut_{4 \rightarrow 3})$.

A característica principal dos acontecimentos $WW$ semi-leptónicos é a redução da energia e momento totais visíveis devido à presença do neutrino. Embora esta redução seje também frequente nos acontecimentos $q\bar{q}$ (devido à emissão de fotões de Bremsstrahlung que podem ser perdidos no tubo de LEP), neste caso, o momento no plano transverso é conservado e os jactos devem ser colineares neste plano. São, assim, rejeitados acontecimentos nos quais a diferença entre os ângulos azimutais dos jactos sejam inferiores a 160$^\circ$. Nos casos em que existe um fotão detectado, e portanto três partículas, a definição espacial não é tão simples mas, de qualquer forma, o momento transverso só pode ser conservado se a diferença máxima entre os ângulos azimutais for superior a 180$^\circ$(neste caso rejeitam-se acontecimentos em que esta diferença seja inferior a 175$^\circ$).

Na tabela 5.2 estão indicados os números de acontecimentos que, nos dados reais e nas várias simulacões, respeitam os critérios de selecção geral $q\bar{q}$ (nível 1) e os critérios de rejeição de $WW$ (nível 2). Na figura 5.1 mostra-se a evolução ao longo da selecção para três variáveis: o número de fotões detectados, a massa invariante do sistema de dois jactos (para acontecimentos em que não foram detectados fotões) e a energia do fotão (para acontecimentos com um único fotão detectado). Os cortes feitos no segundo nível de selecção reduzem a contaminação de $WW$ de 9.2% para 3.2%.

Existe um excesso de acontecimentos nos dados em relação às previsões da si-mulação, que é particularmente evidente no caso de acontecimentos em que são identificados fotões; mas não existe nenhuma grande discrepância na forma das distribuições cinemáticas.


Table: Número de acontecimentos nos dados comparado com as previsões do Modelo Padrão para cada processo, nos dois níveis de selecção descritos no texto. Indica-se ainda a percentagem de contaminação de processos que não $q\bar{q}$, e a razão entre o número de acontecimentos observado e previsto, para cada nível de selecção. A previsão para acontecimentos $q\bar{q}$ foi obtida com KoralZ.
  nível 1 nível 2
DADOS 4430 3978
MC$_{tot}$ 4043$\pm$64 3626$\pm$60
$q\bar{q}$ 3540$\pm$59 3404$\pm$58
WW 373$\pm$19 117$\pm$11
Zee 50$\pm$7 48$\pm$7
ZZ 31$\pm$6 18$\pm$4
$\gamma \gamma $ col. 25$\pm$5 25$\pm$5
Bhabha 10$\pm$3 9$\pm$3
We$\nu$ 14$\pm$4 5$\pm$2
$\tau\tau$ 1$\pm$1 1$\pm$1
Contam. 12.4$\%$ 6.1$\%$
Dados/MC 1.096 1.097


Figure 5.1: Número de fotões isolados detectados em cada acontecimento, massa invariante do sistema de dois jactos e energia do fotão, nos dois níveis de selecção 1 (para acontecimentos de dois jactos) e 2 (anti-$WW$). A massa invariante $jj$ é mostrada apenas para acontecimentos em que não foram detectados fotões e a energia do fotão apenas para acontecimentos em que este fotão é único.
\begin{figure}
\mbox{\epsfig {file=selec_1.eps,width=1.\linewidth}}
\end{figure}


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Sofia Andringa
2001-09-07