FÍSICA II
L.E.Gestão I.
Professor responsável: PEDRO ABREU
Possível Resolução do 2º Exame e 2º Teste

2001/07/16, 9h00
Duração: 2h30 (Exame), 1h30 (Teste: 3,4,5)
Constantes e propriedades úteis
Superf.triângulo b a/2 Superf. círculo r2
Superf.cubo 6a2 Volume cubo a3
Superf.cilindro 2 rL+ base ( r2)+topo( r2) Volume cilindro r2 L
Superf.esfera 4 r2 Volume esfera 4/3 r3
Constante de Boltzmann kB = 1.38 x 10-23 J/K Número de Avogadro NA= 6.022 x 1023mol-1
Cte. gases ideais R = 8.3145 J/K/mol Cte. Gravitação Universal GN = 6.673 x 10-11Nm2Kg-2
1 ano-luz 9.461 x 1015 m Raio da Terra 6.376 x 106m
Constante da Lei de Wien B = 0.00282 mK Cte. de Stefan-Boltzmann = 5.67 x 10-8W m-2K-4
(4.0) 1) Um estudante da L. E. Gestão I. está a praticar salto com elástico (bungee-jumping), na ponte do ``Desfiladeiro da Desgraça'', integrado nas actividades pouco radicais do Festival de Vilar de Mouros. Admita que o desfiladeiro é muito estreito e que as suas imaculadas paredes nunca são atingidas pelo jovem, que vai bebendo aos poucos a sua bebida gasosa. Admita ainda que o coeficiente de elasticidade da corda (comparável neste caso ao coeficiente de uma mola) é K=35 N/m e que o seu comprimento natural sem carga é l=50 m (comparável ao comprimento de equilíbrio de uma mola). Pode ainda ser admitido que a massa que o jovem vai perdendo é desprezável e que energia mecânica do sistema é conservada. Enquanto o jovem de massa m=70 Kg, balouçando alegremente, observa as pinturas neolíticas nas paredes do desfiladeiro e ouve a música cool do Festival,

(1.0) a) determine o(s) grau(s) de liberdade do movimento do jovem;

R: Como o jovem está entalado no desfiladeiro, só pode movimentar-se no plano vertical. Portanto tem dois graus de liberdade, relativos ao movimento segundo a corda elástica (esticá-la) e de oscilação segundo a vertical. Conforme sugestão implícita no enunciado, aproximamos a corda a uma mola, e usamos como coordenadas o comprimento total da corda elástica, r, e o ângulo que esta faz com a vertical, T.

(1.0) b) escreva o Lagrangeano do movimento do jovem;

R: Definindo a ponte como o zero da Energia potencial gravítica, a energia potencial do jovem escreve-se:

EP = -mg r cos(T) + 0.5 K (r-l)2

A energia cinética é dada por EC = (1/2)mv2 em que v é o vector velocidade. Usando as coordenadas r e T no plano vertical, temos (com 'd' símbolo de derivada total):
v = (dr/dt) er + r(dT/dt)eT <=>
EC = (0.5) m ( (dr/dt)2 + r2(dT/dt)2 ) <=>
L = EC - EP = (0.5) m (dr/dt)2 + (0.5) m r2(dT/dt)2 + mg r cos(T) - 0.5 K (r-l)2

(1.0) c) estabeleça a(s) equação(ções) do movimento do jovem;

R: Temos que obter um sistema de duas equações de Lagrange (no seguinte, 'D' representa o símbolo de derivada parcial, e '&' representa a conjunção de duas equações):

D(dL/(D(dr/dt))/Dt - (DL/Dr) = 0 & D(dL/(D(dT/dt))/Dt - (DL/DT) = 0 <=>
D(m (dr/dt) )/Dt - (mr(dT/dt)2 - K(r-l) + mg cos(T) ) = 0 & D(m r2 dT/dt) - (-mgr sen(T)) = 0 <=>
m d2r/dt2 - mr(dT/dt)2 + Kr - mg cos(T) = Kl & mr2 d2T/dt2 + 2mr(dr/dt)(dT/dt) + mgr sen(T) = 0 <=>
d2r/dt2 - r(dT/dt)2 + (K/m)r - gcos(T) = Kl/m & r2d2T/dt2 + 2r(dr/dt)(dT/dt) + grsen(T)=0 <=>
d2r/dt2 - r(dT/dt)2 + 0.5r - 9.8cos(T) = 25 & r2d2T/dt2 + 2r(dr/dt)(dT/dt) + 9.8r sen(T)=0

(1.0) d) e calcule a altura mínima que a ponte deve ter em relação ao à pequena ribeira na base do desfiladeiro, para que o desporto não se transforme em mais uma tragédia.

R: O ponto mais baixo (mais próximo da ribeira) corresponde ao ângulo T=0 (vertical), e à amplitude máxima para r, que há de ser duas vezes a distância da ponte ao jovem no ponto de equilíbrio.
Ora no equilíbrio, T=0 e dT/dt = 0, e req = l + mg/K = 50 + 9.8x70/35 = 69.6 m. Portanto a altura mínima da ponte, 2req, terá de ser 139.2 m ~= 140 m.

(4.0) 2) Um colega do estudante do problema anterior, passeava de barco calmamente na ribeira do desfiladeiro, estando sentado na popa da embarcação. Num certo instante, estando o navio em repouso em relação à água, ele levanta-se e caminha até à proa do barco. Considere que ele levou 20 s a percorrer os 20 m de comprimento do barco, e que tem uma massa m=70 Kg.

(3.2) a) Desprezando o atrito entre o barco e a água, e com massa do barco M=350 Kg,

i) quanto e em que sentido se deslocou o barco em relação à água, após o estudante parar ?
ii) qual a velocidade média do barco em relação à água ?

R: Sem atrito entre o barco e a água, a resultante das forças exteriores sobre o sistema barco-estudante é nula (pois o peso de ambos é compensado pela reacção da água). Assim conserva-se a quantidade de movimento (inicial é nula), e o centro de massa do sistema barco-estudante não se pode mover.

i) Admitimos que o barco tem o seu centro de massa no seu centro geométrico, a 10 m da proa e da popa, e supomos que a proa está na origem do eixo XX, que a popa está no ponto X=20 m, e que o estudante se desloca no sentido negativo do eixo XX. Após o estudante parar, andou 20 m segundo -X, mas o barco andou Y m no sentido positivo do eixo dos XX (+X). Tem-se:

Xcm(inicial) = Xcm(final) <=> 350 x 10 + 70 x 20 = 350 * (10 + Y) + 70 x Y <=>
4900 Kg m = 3500 + 420 Y <=> Y = 1400 / 420 = 10/3 ~= 3.33 m

ii) Sabendo a distância que o barco andou (Y=3.33 m), para saber a sua velocidade média, basta lembrar o estudante levou 20 s a percorrer os 20 m, e portanto o barco levou o mesmo tempo para percorrer os 3.33 m, à velocidade média de
= 3.33 / 20 = 0.167 m/s

(0.8) b) Se não se desprezar o atrito entre o barco e a água, o que acontece ao barco imediatamente após o estudante parar em relação ao barco (o conjunto pára, o conjunto desloca-se ligeiramente no sentido do movimento do estudante, ou o conjunto desloca-se ligeiramente no sentido contrário ao do movimento do estudante) ? Justifique.

R: Se houver atrito entre o barco e a água, a força de atrito é no sentido -X, e é a única força exterior ao sistema barco-estudante. Portanto o centro de massa do conjunto vai acelerar e ganhar velocidade segundo -X. Quando o estudante pára, a força de atrito inverte o sentido, mas imediatamente após o estudante parar e até travar o conjunto, este ainda tem velocidade segundo -X, isto é, o barco desloca-se no sentido -X. Por outro lado, se houver atrito entre o barco e a água, a força de atrito é no sentido -X, travando o barco. A quantidade de movimento do barco é mais pequena que na situação anterior, e a quantidade de movimento do estudante (a velocidade do estudante em relação à água é superior) também é maior. Quando o estudante pára, por exemplo fazendo força nos pés, transfere a sua quantidade de movimento para o barco. Mas como é maior do que a necessária para parar o barco, este ainda se irá deslocar um pouco no sentido do estudante, até o sistema todo parar devido ao atrito com a água.

(4.0/6.0) 3) No sistema da figura, está representado no plano (T,S) um diagrama de funcionamento de uma máquina térmica, onde circula 1 mol de Azoto (gás ideal diatómico com CV=2.5R). A partir do ponto em que a entropia é mais baixa e igual a 20.7862 J/K, e a temperatura é mais baixa e igual à temperatura da fonte fria, TF=300 K, o gás sofre uma transformação em que a relação entre a temperatura e a entropia é linear e crescente, até atingir a entropia máxima de 35.1941 J/K, e a temperatura máxima e igual à temperatura da fonte quente, TQ=600 K, em seguida o gás é arrefecido adiabaticamente até atingir a temperatura mínima, e finalmente sofre uma transformação isotérmica até atingir o ponto inicial.

  (1.0/1.5) a) Qual o rendimento máximo que uma máquina poderia ter usando as mesmas fontes (fria e quente) ?

R: O rendimento máximo é dado por h=1-TF/TQ= 1 - 300/600 = 0.5 = 50%

(1.0/1.5) b) Qual o trabalho realizado em cada ciclo na máquina da figura ?
(sugestão: pense no calor cedido e/ou recebido pelo gás em cada ciclo; note que a figura é no plano (T,S) )

R: Ao longo de um ciclo, o calor cedido e recebido pelo gás é o balanço das trocas de energia, sob a forma de calor, do gás com o exterior (as fontes). Uma troca de calor elementar do gás com o exterior, traduz-se numa variação de entropia do gás dada por

dS = Q/T <=> Q = T dS <=> calor efectivamente recebido pelo gás (calor útil) = balanço do calor =
Q = QFQ - QFF = integral de 'T dS' ao longo de um ciclo = área do ciclo no plano (T,S).

Mas também temos que QFQ - QFF = W = trabalho útil realizado pelo gás, pelo que
W = área do ciclo no plano (T,S) = área do triângulo = (600-300)x(35.1941-20.7862)/2 = 2161.2 J

 

(1.0/1.5) c) Qual o rendimento deste ciclo ?

R: h = W/QFQ = W/(W+QFF)
QFF é o calor cedido pelo gás na transformação isotérmica, QFF = -Q (pois 'cedido' quer dizer negativo), = - T (Sf - Si) = -300x(20.7862-35.1941) J = 4322.4 J
Assim, h = 2161.2/(2161.2+4322.4) = 33.3 %

(1.0/1.5) d) Qual a variação de entropia do Universo em cada ciclo ? Este ciclo é reversível ? Justifique.

R: SU = -QFQ/TFQ + QFF/TFF = -6483.6/600 + 2161.2/300 = 3.6 J/K > 0 <=> ciclo irreversível.

(4.0/6.0) 4) Titã é uma das luas de Saturno com uma velocidade de escape semelhante à da Lua. No entanto Titã tem uma atmosfera de metano (CH4 com massa molar = 0.016 Kg/mol) e amoníaco (NH3 com massa molar = 0.015 Kg/mol) e a Lua não tem atmosfera. Sabendo que a velocidade de escape da Lua é de 2.4 Km/s, que a velocidade de escape de Titã é de 2.6 Km/s, que a temperatura à superfície da Lua (virada para o Sol) é de 100oC, e que a temperatura à superfície de Titã (virada para o Sol) é de -153oC,

(2.0/4.0) a) explique porque é que é menos provável que a Lua tivesse uma atmosfera igual;

R: porque é mais provável que as velocidades das moléculas de metano e de amoníaco sejam superiores à velocidade de escape na Lua do que em Titã.
As velocidades mais prováveis do metano e amoníaco na Lua e em Titã são dadas por
(vmp= (2 R T/massa_molar)(1/2)):
CH4:
vmp(Lua) = 622.8 m/s e vmp(Titã) = 353.4 m/s
Prob(vL > 2400 m/s) = 1 - I(2400/622.8) = 1 - I(3.854) >> Prob(vT > 2600 m/s) = 1 - I(2600/353.4) = 1 - I(7.360)

NH3:
vmp(Lua) = 643.2 m/s e vmp(Titã) = 365.0 m/s
Prob(vL > 2400 m/s) = 1 - I(2400/643.2) = 1 - I(3.73) >> Prob(vT > 2600 m/s) = 1 - I(2600/365.0) = 1 - I(7.12)

(2.0/3.0) b) calcule a probabilidade de, em Titã, ter moléculas de CH4 e NH3 para alturas superiores a uma dada altura H (por ex., H=10000 m). Pode usar a expressão aproximada para a energia potencial de Titã, Ep = mgtH, com gt=1.313 m/s2.

R: A probabilidade para uma molécula ter uma energia superior a E, é dada pela distribuição de Boltzmann:

Prob (E>E0) = exp(-E0/(kBT))

Neste caso E0 é a energia potencial gravítica, e a probabilidade é:
P(H>H0) = prob (E>E0) = prob (E>mgtH0)=
exp(-mgtH) = exp(-2.1x10-5H0) <=>
P(H>10 km) = 81%.

(4.0/6.0) 5) Um estudante da L. E. Gestão I. bebe o seu sumo de cevada admirando o céu estrelado de Vilar de Mouros e ouvindo a música ao vivo dos ``Gorillaz''. O seu detector portátil de radiação mede, após várias correcções, o espectro de uma estrela que se mostra na figura (intensidade de radiação em função do seu comprimento de onda, u(L) (W/m3)). Admita que a estrela, localizada a 100 anos-luz da Terra, é um corpo negro esférico.

(1.2/2.0) a) Qual a Temperatura à superfície da estrela quando a radiação foi emitida ?

R: O gráfico mostra-nos a intensidade em função do comprimento de onda, L. O máximo de intensidade está assinalado, e corresponde ao valor L = 282 nm (=282x10-9 m). Pela Lei de Wien, temos

L=0.00282/T <=> T = 0.00282/L = 0.00282/282 nm = 10000 K

(1.2/2.0) b) Qual a potência por unidade de área emitida pela estrela ?

R: A potência emitida por unidade de área, à superfície da estrela, é dada pela Lei de Stefan:

(P/A)E = emissividade x T4

Como para um corpo negro temos emissividade igual a 1, a potência por unidade de área é simplesmente:
(P/A)E = 5.67 x 10-8x 100004= 5.67 x 108W/m2

(1.6/3.0) c) Se nós detectarmos uma energia total por unidade de tempo e por Km2 de área PT=0.634 mW/Km2, qual o tamanho da estrela (raio) ?

R: A potência por unidade de área que nós detectamos na Terra, é simplesmente a razão entre a potência total emitida pela estrela e a área da superfície esférica de raio igual à distância entre a estrela e a Terra (sendo RE o raio da estrela):

(P/A)T = PE/ (4d2) = (P/A)E (4RE2)/ (4d2) = (P/A)E (RE/d)2 <=>
0.634 x 10-3 /(10002) W/m2 = 5.67 x 108 (RE/9.46x1017)2 <=>
RE = 109 m.

(0.0/0.0) d) Qual o nome da estrela ?

R: f2 do catálogo Lista Especial de Galáxias Internacional

Se quiser, pode consultar as notas deste exame/teste.